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quinta-feira, 18 de junho de 2009

VLT, O SONHO QUE VIROU FERRUGEM


Artigos / Entrevistas

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Corria o final da década de 1980. O governador paulista, Orestes Quércia (PMDB), interessado em fazer o sucessor no Palácio dos Bandeirantes e a alçar voos mais altos em sua carreira política – ele sonhava em chegar à Presidência da República e se candidataria ao cargo em 1994, sem sucesso –, escolheu Campinas, onde fora prefeito, para implantar o que considerava um projeto revolucionário, a última palavra no setor do transporte ferroviário.

Rápido, econômico, confortável e seguro, segundo as promessas que encantaram alguns incautos, era chamado de VLT, ou Veículo Leve sobre Trilhos.

Apresentado e celebrado na época como a redenção do transporte campineiro, o VLT é hoje, decorridas quase três décadas, um símbolo do fracasso. Implantado de afogadilho em 1990, sem um estudo razoável de viabilidade econômica, o projeto torrou US$ 120 milhões dos cofres estaduais, não conseguiu viabilizar-se financeiramente e terminou abandonado cinco anos depois. Idealizado para deslocar 100 mil pessoas por dia, nunca superou as cinco mil passagens diárias. Os balanços fecharam sempre no vermelho. A receita estabilizou-se, em valores atualizados, em R$ 60 mil mensais enquanto a despesa batia na casa dos R$ 760 mil.

Símbolo de progresso econômico e social, Campinas orgulha-se de ser reconhecida internacionalmente como polo tecnológico e universitário. Há, no entanto, um claro sentimento de frustração quando algum forasteiro cita o VLT. Serviu apenas para o Quércia fazer o sucessor, ri a jornalista Maria Teresa Costa, referindo-se a Luiz Antonio Fleury Filho (1991-1995). Repórter da Agência Anhangüera de Comunicação, que edita o principal diário da Cidade, o Correio Popular, ela calculou e descobriu, em um trabalho minucioso de investigação, grande parte dos valores e dados utilizados nesta reportagem.

Andar pelos 7,8 quilômetros da antiga linha do VLT em Campinas, como fez uma equipe de O Diário na última sexta-feira, é uma experiência assustadora – ainda mais diante da perspectiva de que algo idêntico está sendo projetado para Mogi das Cruzes. Percorrendo a linha férrea e os esqueletos das antigas estações, desativadas há 13 anos, a impressão é que se está bisbilhotando uma cidade fantasma. O mato e a sujeira tomam conta das linhas e os pontos de parada estão todos sucateados, depredados e pichados. Só se ouve o som do vento e, por vezes, o de algum cachorro fugindo em disparada.

Muitos pontos do antigo trajeto, entre as estações Central e Campos Elísios, estão completamente interditados. Ora pelos entulhos ou montes de lixo depositados no decorrer dos últimos anos, ora pela densidade da vegetação que toma conta do leito da ferrovia. Treze anos de abandono foram suficientes para algumas árvores nascerem e se fortalecerem entre brita, dormentes e trilhos. Diante do fracasso das operações do VLT e dos problemas advindos delas, a mais nova ideia da Prefeitura de Campinas é aproveitar o traçado para construir uma avenida para ônibus. Mas isso ainda é só um plano.

Com claros objetivos eleiçoeiros, mais focada no marketing do novo sistema – dizia-se que as cidades mais modernas do planeta já contavam com alternativa idêntica – do que nas necessidades do usuário, a implantação do VLT em Campinas guardou inúmeras denúncias de irregularidades e alguns lances de comédia pastelão. Contratada pelo Estado, via Ferrovias Paulistas Sociedade Anônima (Fepasa), a obra foi executada pela Construtora Mendes Júnior.

A concorrência aberta para a construção do sistema foi, segundo denúncias publicadas na época pela Imprensa, superfaturada e viciada. A inauguração foi feita com a obra ainda em andamento, em 23 de novembro de 1990, dois dias antes do segundo turno que elegeria Fleury, com trens emprestados do Metrô do Rio de Janeiro. Na inauguração oficial, em 14 de março de 1991, as composições falharam e deixaram 300 pessoas a pé – entre elas, Quércia.

Mas por que o VLT deu errado em Campinas? A tarifa era igual à dos ônibus, não havia integração com os outros modais de transporte, não chegava às regiões mais populosas transportava apenas cinco mil passageiros por dia, quando precisava atender a 100 mil para se viabilizar economicamente, enumera Maria Teresa. Vamos ser sinceros: não deu certo porque os interesses políticos se sobrepuseram ao planejamento, traduz a agente de saúde Maria Helena, uma das antigas usuárias do Veículo Leve sobre Trilhos. E olha que lá ele não parava em semáforos, ou seja, diferentemente do que estão querendo trazer em Mogi, tinha preferência sobre o transporte individual feito por automóveis.

Mogi reage ao fim dos subúrbios

Aos poucos, conforme vai ficando mais claro o que significa substituir os trens de subúrbio pelo Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), representantes de entidades da sociedade civil e usuários do sistema ferroviário começam a manifestar preocupação com a proposta da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). A maioria dos entrevistados pela reportagem de O Diário rejeita a baldeação que terá de ser feita em Suzano. Teme-se que o novo meio de transporte seja mais lento e mais perigoso.

Se hoje, com muros e cancelas, já existem acidentes com os trens, imagina então o que vai ocorrer quando o VLT circular pelo meio de pessoas e carros. Quem é que será responsabilizado quando a primeira pessoa morrer?, pergunta o presidente da Associação dos Moradores do Jardim São Pedro e Região, Adalberto Santana de Andrade. Ele quer trazer o Ministério Público para a discussão, para que os promotores cobrem a realização de uma audiência pública sobre o assunto.

O governador José Serra (PSDB), assim como alguns de seus antecessores, elegeram-se com a promessa de trazer o Expresso Leste até Mogi. Por que mudaram de ideia assim tão de repente?, questiona Nabil Francisco de Moraes, conselheiro do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), coordenador da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e membro do Diretório Municipal do PT. Pelo que ouvimos, o VLT é rejeitado pela maioria dos usuários.

A Assembleia Legislativa será uma das frentes de batalha contra o VLT. Segundo apurou O Diário, o deputado José de Souza Cândido vai articular a bancada do PT para pressionar o governador a expandir o Expresso Leste até Mogi. Aos poucos, a opinião pública vai se posicionando contra a proposta de Serra. Não há sentido em retirar trens que prestam serviços para a população. VLT é bom, mas não para substituir algo bom que já existe, opina o especialista em história ferroviária Ralph Mennucci Giesbrecht, do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.

Há também os que são favoráveis. O prefeito Marco Aurélio Bertaiolli (DEM) é o maior entusiasta da ideia. Neste momento, não se trata de escolher apenas entre um meio de transporte e outro, mas sim qual o conceito de cidade que gostaríamos de ter para Mogi das Cruzes no futuro. Por isso, é fundamental a participação da sociedade para conhecer o sistema que está sendo proposto pela CPTM.

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